domingo, 3 de junho de 2012

A Antiguidade e os pressupostos do conhecimento científico

Clara Maria C. Brum de Oliveira

 “Não entre quem não for geômetra”
(PLATÃO apud REALE, 1990, p. 286)

Se pensarmos no advento da metalurgia, tecelagem, cerâmica, agricultura e a escrita, por volta do ano 3000 a.C., percebemos que o desenvolvimento da técnica resultou da observação. Sem mencionar o conhecimento da astronomia e matemática desenvolvido pelos babilônicos. É neste ponto que podemos dizer que os gregos apresentaram uma postura muito específica: não viveram mergulhados na técnica ou prática, mas na teoria.

Os primeiros filósofos discutiram as ideias produzindo diferentes explicações para os fenômenos naturais, sem recorrer às explicações mitológicas (LLOYD, 1970, p. 10-15). Sem dúvida, os primeiros filósofos-cientistas, foram os pré-socráticos. Eles se preocuparam com a origem da vida e com o movimento da natureza.

Apesar de o conhecimento matemático nos levar à tradição fenícia e egípcia, os gregos transformaram a sabedoria prática de tais povos em conhecimento científico. Assim apresentaram a matemática como ciência, operando com números, figuras, relações e proporção. Tais conhecimentos se tornaram atividades típicas do pensamento abstrato, ou seja, puramente intelectuais. Nesse novo modo de proceder alcançava-se o conhecimento verdadeiro e universal, atribuindo à matemática o status de saber extraordinário. Foi por essa razão que Platão colocou a matemática como um pressuposto ao pensamento filosófico.

Encontramos em seu pensamento a primeira formulação clássica da Filosofia, ou seja, o conhecimento como objeto de investigação. Nesse sentido, apresentou uma preocupação direta sobre o método, indagando se é realmente possível o conhecimento. Este pensador adotou o método explicativo da matemática e apresentou o mundo material como cópia do mundo das idéias, ou seja, o mundo do pensamento.

Este mundo do pensamento que chamou de mundo inteligível foi concebido como o mundo original, o lugar do conhecimento verdadeiro. Já o mundo material ou sensível, o nosso mundo fenomênico, era visto como o lugar das coisas perecíveis, mutáveis e, portanto imperfeitas.

O fato é que Platão considerou a matemática como um prelúdio à filosofia (ARANHA; MARTINS, 2002, p. 136-137). Desde Pitágoras até Platão o pensamento filosófico priorizou a razão como o caminho para o conhecimento verdadeiro, a episteme. Assim, podemos destacar que este pensador valorizou a atividade intelectual enquanto contemplação desvinculada da experiência cotidiana.

Apesar da genialidade de Platão, Aristóteles (384-322) foi considerado o sistematizador do pensamento ocidental, tendo contribuído no campo das Ciências Naturais, História da Filosofia, da Psicologia, das leis da argumentação e da Lógica.

Bem diferente de seu mestre, acreditou ser possível conhecer o mundo a partir da experiência sensível, bastando aplicar a razão aos dados alcançados através da observação. Desta forma, Aristóteles elaborou a tese segundo a qual o conhecimento começa pelo dado sensível, mas precisa do pensamento que promove uma abstração. Termo que em filosofia significa colocar o objeto de estudo separado mentalmente, para uma análise cuidadosa.

É bom esclarecer que não encontramos neste pensador a experimentação, mas a observação. Há algumas justificativas para isso e uma delas decorre do fato de estarmos diante de uma cultura que desprezava as técnicas manuais, estamos numa cultura cujo paradigma é método da contemplação. Ele estava interessado em saber os fundamentos ou as causas e não a descrição dos fenômenos.

Na compreensão de Aristóteles, a física é a ciência que trata do ser em movimento cujos pressupostos estão na relação ato-potência e na teoria das quatro causas. Nesse sentido, todos os seres ocupam um lugar natural conforme sua essência. Como estudioso do pensamento pré-socrático, partiu da teoria de Empédocles que estabeleceu como matéria-prima originária em todos os seres os quatro elementos, ou seja, a água, a terra, o fogo e o ar. Interessante é que esta teoria pré-socrática retomada por Aristóteles permaneceu até o séc. XVIII, quando foi substituída pela teoria das substâncias compostas de Antoine-Laurent de Lavoisier (1743-1794), cientista francês, considerado o criador da Química Moderna (autor da célebre frase: "Na Natureza nada se cria, nada se perde, tudo se transforma").

Na teoria aristotélica do movimento dos corpos, os seres são influenciados pelo peso ou leveza e, por conseguinte, os corpos pesados ficam naturalmente embaixo e os leves têm como lugar natural a parte de cima. Com base em tal concepção, Aristóteles afirmou que a pedra, porque é pesada, cai; o fogo sobre porque é leve, sobe. Tudo bem, mas como explicar o movimento de uma pedra arremessada para cima ou da flecha pelo arco? Aristóteles chamou tais movimentos de movimento violento, ou seja, há um motor que provoca esse movimento e  que não é natural. Tese refutada por Galileu Galilei, no séc. XVI.

*Na astronomia, Aristóteles fundamentou suas idéias a partir do pensamento de um dos discípulos de Platão que havia pensado no modelo geocêntrico, segundo o qual a Terra ocupava o centro do Universo. Esse modelo também foi conhecido como o modelo das esferas homocêntricas. Sabe-se que um pensador da cidade de Samos chamado Aristarco (310-230 a.C.) chegou a formular a tese heliocêntrica, sem qualquer sucesso já que os gregos eram adeptos do geocentrismo.

No modelo astronômico, Aristóteles estabeleceu uma hierarquia dividindo o universo em mundo sublunar e supralunar. O mundo sublunar compreende a Terra como um corpo imóvel, lugar natural de seres móveis, perecíveis, em movimento retilíneo para baixo e para cima. O mundo supralunar é constituído pela Lua, Mercúrio, Vênus, Sol, Marte, Júpiter, Saturno e as estrelas fixas. São corpos que segundo o filósofo são constituídos pela quinta-essência e não pelos quatro elementos (fogo, água, terra e ar). São corpos perfeitos e realizam o movimento circular que para a tradição grega seria o movimento que expressa perfeição (ARANHA; MARTINS, 2002, p. 138-139).

Ao observar o céu, Aristóteles percebeu que tudo permanecia em sua perfeição, sem mudança, a despeito do movimento dos astros. Havia uma harmonia perceptível a olho nu. A Terra ocupava um lugar de destaque, mas permanecia imóvel. Assim, realmente acreditava na imobilidade da Terra e para prová-la afirmava que bastaria um observador lançar um objeto para cima que o mesmo retornaria ao lugar de origem. Ora, se a Terra se movesse, tal objeto cairia em outro lugar, pois no momento em que estivesse no ar, a Terra se deslocaria.

O universo aristotélico era finito, esférico e organizado da seguinte maneira: a Terra no centro, era constituída pelos 4 elementos (água, fogo, terra e ar), seguida da Lua, Mercúrio, Vênus, Sol, Marte, Júpiter e Saturno. Os corpos celestes seriam constituídos por uma quinta-essência: o éter, concebido como um elemento puro, transparente e sem peso, que contrastava com os quatro elementos constituintes da Terra, sujeitos a mudanças e que, portanto perecíveis. Esse era o sistema do mundo concebido por Aristóteles, constituído por 11 esferas concêntricas em movimentos circulares perpétuos.

Essa tese astronômica demonstra que concepção geocêntrica era o paradigma da cultura grega. A única tentativa de uma teoria heliocêntrica aconteceu por volta do séc. III a. C., como Aristarco de Samos. Este pensador grego supôs as estrelas fixas e imutáveis, mas a Terra girando em torno do Sol em movimento circular.  Assim, concebeu o Sol como centro em um cosmo infinito. Todavia, por volta do ano 150 a.C., matemáticos gregos bloquearam sua tese e ressaltaram o sistema geocêntrico.

É interessante que a astronomia aristotélica pode nos parecer risível, mas foi totalmente incorporada por Cláudio Ptolomeu (83-161 d.C.) e figura na obra deste cientista grego, “O grande tratado[1]” (Almagesto) como sistema do mundo. O fato é que esta teoria perdurou como verdade incontestável durante o mundo antigo, toda a Idade Média, encontrando óbice no pensamento de Nicolau Copérnico e mais tarde com Galileu Galilei.

No final do mundo antigo, o império alexandrino produziu mudanças significativas que assinalaram o fim da época clássica e o início de uma nova era – a fase helenística.  Nesta fase, o domínio macedônico sobre a as cidades gregas impulsionou o surgimento de novas filosofias que teorizaram uma realidade diferente.

Os gregos até Aristóteles acreditavam que os povos orientais eram  verdadeiros bárbaros, mas o ambicioso projeto político de Alexandre Magno modificou esse olhar. Nesta ocasião Atenas ainda se mantinha como o centro filosófico do mundo conhecido, mas gradualmente as cidades como Pérgamo, Rodes e Alexandria se destacaram num novo cenário: o cenário da cultura científica.



A cidade de Alexandria construída por Alexandre junto à foz do Nilo se tornou a capital cultural do mundo helenístico. Com terra fértil para o cultivo, localização privilegiada para o comércio, atraiu povos de variadas culturas, bem como muitos intelectuais gregos.  Nesta famosa cidade, encontramos o “Museu”, instituição sagrada dedicada às Musas, protetoras das atividades intelectuais com um acervo para estudiosos interessados em pesquisas médicas, biológicas e astronômicas. Ao lado, como um anexo, a “Biblioteca”, contendo inicialmente quinhentos mil livros.
Nessa atmosfera espiritual, a matemática ocupava lugar de destaque e, nesta matéria, Euclides de Alexandria (360-295 a.C.) foi considerado um dos maiores matemáticos do mundo antigo. Criador da famosa geometria euclidiana que perdurou por muitos séculos. Sabe-se que recebeu influências de Pitágoras e de Platão e escreveu uma obra chamada Elementos, em 13 volumes, versando sobre geometria plana, figuras poligonais, círculos, proporção e teoria dos números. Sua obra se manteve viva até o séc. XIX.
Além de Euclides, Apolônio de Perga que viveu no séc. III a.C., também foi considerado um dos maiores matemáticos gregos depois de Euclides e de Arquimedes. Apolônio estudou a matemática e expôs os três tipos cônicos: a elipse, a parábola e a hipérbole. Se este pensador tivesse aplicado sua descoberta à astronomia, não teria dado a Kepler, muitos séculos depois, o mérito de revolucionar as teorias das órbitas planetárias (REALE, 1990, 288).
Arquimedes (287 – 212 a.C.) foi considerado o mais genial dos cientistas gregos,  viveu e usou suas invenções para proteger a cidade de Siracusa. Escreveu inúmeras obras e inventou máquinas engenhosas que defenderam por longo tempo a sua cidade do ataque das tropas romanas. Dizem que Cícero ao encontrar seu túmulo, mandou restaurá-lo como prova de grande veneração (REALE, 1990, 288).
Arquimedes lançou as bases da hidrostática que resultou no princípio que leva o seu nome, o princípio de Arquimedes, segundo o qual “as grandezas mais pesadas do que o líquido, abandonas no líquido, são transportadas para baixo, até o fundo, e serão tanto mais leves no líquido quanto é o peso do líquido que tem tal volume quanto o volume da grandeza sólida” (REALE, 1990, 289).

Em mecânica criou o princípio da alavanca. Arquimedes pensou numa reta em forma de haste, apoiando-se sobre um ponto de apoio, com dois pesos iguais nos extremos e em distâncias iguais do centro, em equilíbrio. Se as distâncias forem desiguais, haverá uma inclinação para um dos lados. Com essa experiência chegou à lei segundo a qual duas grandezas estão em equilíbrio a distâncias que estejam em recíproca proporção às suas próprias grandezas.

A tradição relata que Arquimedes teria dito a seguinte frase: “ Dá-me um ponto de apoio e te erguerei a Terra!” enquanto  utilizava o sistema de alavancas para descer ao mar uma grande embarcação (REALE, 1990, 291).  Pesquisadores atribuem a Arquimedes muitas invenções interessantes que vão desde catapultas até várias combinações de roldanas. Mas o episódio mais interessante sobre a vida de Arquimedes é o que menciona em que contexto o matemático teria gritado “Eureka!” que em grego significa “Descobri!” Vejamos 


Hiéron, rei de Siracusa, quis oferecer uma coroa de ouro no templo. Mas o ourives subtraiu uma parte do ouro, substituindo-o por prata, que combinou com a restante parte de ouro na liga. Aparentemente, a coroa ficou perfeita. Mas, surgindo a suspeita do roubo e, como Hiéron não podia dar corpo à suspeita, pediu a Arquimedes que lhe resolvesse o caso, refletindo sobre o que estava ocorrendo. Arquimedes começou a pensar intensamente na questão. E, num momento em que se preparava para tomar banho, observou que, ao entrar na banheira (que, naquela época era uma tina), saía água na mesma proporção do volume do corpo que entrava. Assim, de repente, intuiu o sistema com o qual poderia determinar a pureza ou não do ouro da coroa. (Arquimedes prepararia dois blocos, um de ouro e um de prata, cada qual de peso igual ao da coroa; imergi-los-ia na água, medindo o volume de água deslocado por cada um deles e a relativa diferença; depois, verificaria se a coroa deslocaria um volume de água igual ao deslocado pelo bloco de ouro; se não acontecesse isso, significaria que o ouro da cora havia sido alterado.) No entusiasmo da descoberta, precipitou-se para fora da tina e correu para a casa, nu como estava, gritando “descobri, descobri”, que em grego se diz “eureka”, exclamação que se tornou proverbial, estando em uso até hoje. (REALE, 1990, 292).

Os gregos buscaram respostas racionais para os problemas da vida e descobriram no conhecimento matemático uma fonte inesgotável de saber. Desde os pré-socráticos, a matemática manteve-se como um saber teórico. Sabe-se que somente com Pitágoras é que foi introduzido no ensino destinado à formação de filósofos, mas restrito a um grupo seleto.  Bem mais tarde, o ensino da matemática (aritmética, geometria, música e astronomia) foi reintroduzido na educação do jovem grego com os sofistas, em especial, Hípias de Elis (460-399 a.C.).

O desenvolvimento do pensamento científico, na fase helenística, nos direciona à seguinte idéia: o encontro de culturas na região e o espírito de liberdade que os pensadores gregos experimentaram, em solo egípcio, sob a proteção de Ptolomeu, foram fundamentais para o desenvolvimento de uma nova postura, voltada para a técnica sem, no entanto, sair do paradigma ou modelo do saber teórico.

A ciência de Alexandria estava distante dos dogmas filosóficos e preconceitos de uma cultura que colocara o escravo no lugar da máquina, razão pela qual o Senhor podia evitar esforços ou questões práticas do cotidiano das poleis (cidades-estados gregas, plural de polis) gregas. O senhor poderia dedicar-se à atividade da razão, sem se preocupar com o mundo da vida.

Os precursores da ciência moderna: o humanismo renascentista e a superação do paradigma teocêntrico
A expressão “Magister dixit...” (o mestre disse...), nos permite compreender um pouco da postura intelectual predominante durante o período denominado Idade Média. Fase que antecede o movimento renascentista em que percebemos a importância conferida ao princípio da autoridade em detrimento da reflexão livre e da investigação da natureza.
Muitos estudiosos caracterizaram os densos séculos da Idade Média como uma época rude, marcada pela fome, pelo desaparecimento da vida intelectual, assolada pela violência, em que a Igreja ocupara o lugar da Roma Imperial (MANCHESTER, 2004, p. 27).

Acredita-se que por volta do séc. XIII durante o pontificado de Inocêncio III (1198-1216) reapareceram escritos aristotélicos até aquela data desconhecidos. Na verdade, a herança cultural da Grécia começava a reaparecer, reacendendo problemas e oportunizando novos caminhos. O movimento ficou conhecido pelo nome italiano Rinascimento, cuja data inicial não é precisa, mas  acreditamos que caracterizou o início do séc. XV e o séc. XVI.

O que encontramos nessa fase? 

Até este momento, durante os 1436 anos que marcaram a Idade Média, com seus 211 Papas, a Igreja era indivisível, a vida a pós a morte era concebida como certeza absoluta e acreditava-se que tudo já era conhecido. O mundo se resumia ao cosmo descrito por Cláudio Ptolomeu: a Terra o centro, na verdade a Europa, tendo ao seu lado a Terra Santa e o norte da África. Há relatos que os cartógrafos medievais, quando chegavam aos limites geográficos conhecidos, escreviam em seus mapas: “Cuidado: Dragões à espreita além deste ponto” (MANCHESTER, 2004, p. 57).

Não perderemos tempo aqui em descrever a Idade Média, mas observar que o movimento renascentista que se configura no interior da mentalidade medieval não pode ser visto apenas como um movimento filosófico, mas foi essencialmente uma mudança na vida em todos os seus aspectos: sociais, políticos, morais, religiosos e literários. Sabemos que tudo começou com nossos navegadores que se afastaram do mundo conhecido e provocaram o desenvolvimento de novas técnicas para dar conta do novo empreendimento marítimo.

Nesse caminho, autores gregos e latinos ocuparam espaços, marcando início de uma nova época, uma nova leitura de antigos textos, exigindo dos estudiosos que deixassem de lado as traduções medievais e buscassem comentadores gregos, além de outros pensadores até então desconhecidos. Talvez a essência desta fase esteja no modo como revigoraram o passado na tentativa de compreender o presente.

Mas o termo Renascimento apareceu na obra de Jacob Burckhardt[2] (REALE, 1990, p. 24-25), publicada em 1860, no sentido de movimento de exaltação da vida mundana e liberdade de pensamento oposta à mentalidade medieval. Um espírito que rompendo com o pensamento medieval inaugura uma nova visão de mundo. Por conseguinte, do ponto de vista da história do pensamento, o Renascimento é visto como as raízes do mundo moderno cujo marco inicial está na revolução científica operada por Galileu Galilei (1564-1642).

A Revolução Científica

O período denominado como da “revolução científica” marcou uma fase que se estende desde a publicação da obra Da Revolução de Esferas Celestes (De revolutionibus orbium celestium) de Nicolau Copérnico, em 1543, até a publicação da obra Princípios Matemáticos da Filosofia Natural (Philosophiae naturalis principia mathematica) de Isaac Newton, em 1687. Mas o que significou essa revolução? Na verdade foi uma revolução astronômica, uma mudança na imagem do mundo que teve como expoentes: Copérnico, Tycho Brahe, Johannes Kepler, Galileu Galilei e Isaac Newton. Uma mudança gradual sobre o homem, sobre a ciência, sobre o trabalho científico e principalmente sobre a relação entre o saber científico e religioso.

Nesta nova fase cai por terra a cosmologia aristotélico-ptolomaica, pois Copérnico colocou o Sol no centro do mundo; Tycho Brahe desenvolveu a idéia de órbita; Kepler apresentou o movimento elíptico dos planetas; Galileu afirmou que a Lua é da mesma natureza que a Terra, inventou o telescópio e investigou o céu, separando com isso a ciência antiga dos novos tempos. Newton desenvolveu sua teoria gravitacional.

Nicolau Copérnico

Nicolau Copérnico (1473 - 1543) foi um pensador polonês, viveu numa época em que a astronomia de Aristóteles e o sistema de Cláudio Ptolomeu vigoravam. Tais sistemas compreendiam a Terra como central, imóvel, o movimento circular como perfeito e a finitude do universo.  Tais idéias estavam adequadas à tese de um universo criado em função do homem.

Mas atormentado com o problema do movimento releu várias vezes as obras  dos filósofos antigos na tentativa de  encontrar uma resposta. Ao reler Cícero observou que este pensador romano mencionara a opinião de um pensador antigo do séc. V. a.C. chamado Iceta de Siracusa, segundo o qual a Terra estaria em movimento. Continuando em suas pesquisas descobre ainda que os pitagóricos Filolau e Ecfanto, bem como Heraclides de Ponto, que acreditavam que a Terra girava. Encorajado nesta tese supostamente absurda afirmou que tudo estava em movimento.  Em síntese, Copérnico defendeu as seguintes teses: 1. A Terra é esférica; 2.  A Terra se move em um círculo orbital em torno do seu centro, girando também sobre o seu eixo; 3. A Terra não era o centro do mundo, mas o Sol (REALE, 1990, p. 226-227). Com tais idéias Copérnico conseguiu se tornar o ponto de partida para pensadores posteriores, o ponto de partida para uma nova astronomia.

Sua obra foi inicialmente considerada por teólogos influentes como instrumentalista, ou seja, suas descrições seriam tomadas apenas como instrumentos úteis para efetuar previsões e dar explicações sobre os corpos celestes. Na verdade o próprio Copérnico a considerava uma teoria realista, porque entendia que esse era o compromisso do filósofo: buscar a verdade.

Tycho Brahe

O dinamarquês Tycho Brahe (1546-1601), depois de Copérnico, foi um virtuoso da observação astronômica. Ocupou lugar de destaque, sendo sucedido após sua morte por seu jovem assistente Johannes Kepler. Através de suas acuradas observações, ressalte-se, a olho nu, resolveu vários problemas que a astronomia enfrentava em sua época.

Brahe inovou ao observar a trajetória dos cometas que o levou a afirmar que no universo existiam órbitas ou trajetórias livres, em todas as direções, refutando a tese das “esferas materiais”, ou seja, as esferas concêntricas do sistema aristotélico. Acrescentou que os cometas revelavam uma órbita oval e não circular como acreditavam os antigos pensadores da cosmologia tradicional.

Brahe não aceitava a tese da mobilidade da Terra de Copérnico, nem acreditava no sistema do mundo apresentado por Cláudio Ptolomeu. Tomando as duas teses como ponto de partida, este pensador investigou minuciosamente o sistema do mundo, manteve algumas observações do sistema copernicano, mas confirmou que os planetas giravam em torno do Sol. Sendo que a Lua e o Sol, por sua vez, giravam em torno da Terra (REALE, 1990, p. 227-233).

Johannes Kepler

Diferente de seu mestre Tycho Brahe, Johannes Kepler (1571-1630) partiu da tese copernicana, misturando-a as idéias do neoplatonismo que valorizava a harmonia do universo. Assim, Kepler acreditava que a Natureza estava ordenada segundo leis matemáticas. Isso nos lembra Platão!

Seus estudos configuram o que entendemos hoje por um procedimento verdadeiramente científico que começa com a proposta de uma questão-problema, seguida de uma série de conjecturas para solucioná-la que passam por uma análise minuciosa até se alcançar uma teoria possível. Nesse procedimento, percebe-se a paixão do investigador ao realizar sua pesquisa, ao enfrentar as desilusões e a ansiedade diante de muitos fracassos.

Nem Ptolomeu, nem Copérnico, Kepler chegou à conclusão que os planetas moviam-se em órbitas elípticas, com velocidades variáveis, afastando a tese dos círculos concêntricos ou esferas ovais como acreditavam. Este pensador elaborou três leis importantes: 1ª as órbitas dos planetas são elipses das quais o Sol ocupa um dos focos; 2ª a velocidade orbital de cada planeta varia de tal modo que a linha que liga o Sol e o Planeta cobre, em iguais intervalos de tempo, iguais proporções de superfície da elipse; 3ª os quadrados dos períodos de revolução dos planetas estão na mesma relação que os cubos das respectivas distâncias do Sol (REALE, 1990, p. 244-245).


Galileu Galilei

Galileu Galilei (1564-1642) foi o fundador da ciência moderna e o teorizador do método científico, bem como da autonomia da pesquisa científica. Suas idéias seguiram as teses do copernicanismo aperfeiçoado pelo uso da luneta. Suas descobertas renderam-lhe a acusação de heresia, sendo obrigado pelo Santo Ofício a abjurar as idéias que afirmara. Mais tarde foi condenado a prisão perpétua, posteriormente comutada em prisão domiciliar.

Com o aperfeiçoamento da luneta inventada pelos holandeses, Galileu começou a acumular uma série de provas que afastavam os obstáculos que se interpunham à aceitação do sistema heliocêntrico de Copérnico. Deste episódio temos que destacar que ao usar a luneta, este pensador inovou ao usar um objeto como instrumento científico, pela primeira vez na história. Essa conduta atacava a postura do mundo científico da época que não se perturbara com a descoberta daquele instrumento e, o que é pior,  o considerava danoso porque acreditavam que poderia entontecer o espírito do observador.

Numa época em que se usavam sanguessugas para curar pneumonia, usar um instrumento para vasculhar o céu não parecia nada racional. Todavia, com esse instrumento, Galileu observou montanhas e vales sobre a Lua e um amontoado de inumeráveis estrelas jamais vistas, idéias que se afiguravam perigosas às verdades da fé.
Este pensador proclamou a veracidade do sistema copernicano do mundo, reivindicando a autonomia da ciência quando afirmou que a Bíblia não era um tratado de astronomia e não poderia conter informações sobre a constituição e os movimentos dos céus e das estrelas. Atacado pelos teólogos, mas não contido, lançou mão das sensatas experiências e das demonstrações certas, considerando que a ciência não deveria ser um saber a serviço da fé porque se fundamenta em razões diversas. A ciência tem compromisso com a descrição verdadeira da realidade.

A postura científica de Galileu desvelou o núcleo essencial do método científico, ou seja, a ciência é um saber que procede de um método baseado em experiências e demonstrações que partem de uma hipótese. Não pura simplesmente uma observação comum porque estas podem errar, mas um experimento que pressupõe correção - ajustes. Uma interrogação metódica da natureza. Um experimento científico em que o espírito ativo faz suposições e extrai conseqüências, numa relação mútua de correção e aperfeiçoamento.

Assim, podemos afirmar que a contribuição mais importante de Galileu foi o desenvolvimento do método científico cujos princípios são: 1. Observar os fenômenos tais como ocorrem, afastando preconceitos ou conceitos de natureza religiosa; 2. Submeter as idéias à experimentação, ou seja, verificação; 3. Descobrir a regularidade matemática em todos os fenômenos observados.

Isaac Newton

Isaac Newton (1642-1727) foi um grande investigador experimental que conseguiu sintetizar as duas grandes correntes da ciência moderna: a matematização e a experiência. Inovou quando criou o cálculo infinitesimal, desenvolveu e sistematizou a mecânica, a teoria da gravitação universal, as leis de reflexão e refração luminosas e a teoria sobre a natureza corpuscular da luz.

O primeiro aspecto que devemos observar no pensamento científico de Newton foi seu modelo mecanicista de ciência. O segundo aspecto está no seu método indutivo, ou seja, método científico que consiste em fazer experimentos e observações e, em seguida derivar conclusões gerais mediante indução.

O modelo mecanicista de Newton foi profundamente influenciado pela visão do filósofo e matemático francês René Descartes (1596 - 1650), segundo a qual o universo está em movimento e sua descrição se resume na compreensão das interações básicas de seus componentes para formular matematicamente as leis que os regem. Newton afirmou que a Natureza é simples e uniforme e que o sistema do mundo se equipara a uma grande máquina, cujas partes em funcionamento desvelam leis que podem ser detectadas indutivamente através da observação e experimento.

Quando investigamos a trajetória dos grandes cientistas observamos que cada um contribuiu para o desenvolvimento do pensamento científico com teorias, nem sempre verdadeiras, nem totalmente falsas, mas úteis na reavaliação de conceitos e fatos. Importa perceber que todo o conhecimento coloca o problema da verdade, porque acontece na relação entre o sujeito que conhece, o cientista, e o objeto investigado: enunciados  ou fatos. É neste ponto que vale lembrar que o olhar do pesquisador ou cientista não é fortuito, não é um olhar ao acaso, mas rigoroso, metódico e incansável.

Para Karl Popper (1922-1996), a ciência começa com um problema[3] que incomoda o cientista, ou seja, o trabalho científico é precedido pela formulação de um problema e pelo horizonte de expectativas que ele provoca. Assim, motivado por um problema, elabora conjecturas, uma possível solução que será verificada, testada. Nesta lógica, Popper (1977, p. 181) acreditou que o mais importante está na busca pela refutação das teorias científicas, procedimento que desvela uma revolução permanente.


Meu ponto de vista é de (...) que a ciência parte de problemas; que esses problemas aparecem nas tentativas que fazemos para compreender o mundo da nossa experiência (experiência que consiste em grande parte de expectativas ou teorias, e também em parte em conhecimento derivado da observação – embora ache que não existe conhecimento derivado da observação pura, sem mescla de teorias e expectativas).

Até aqui estudamos cientistas que buscaram o conhecimento científico como um conhecimento racional, objetivo, verificável, claro, preciso e todos utilizaram um método, ou seja, não agiram ao acaso, mas planejaram seu trabalho. Buscaram fundamento em conhecimentos anteriores significativos.

O conhecimento científico não é definitivo, absoluto ou final, mas experimenta novas indagações, a substituição gradual de hipóteses que provocam até mesmo verdadeiras revoluções. A história do pensamento científico esclarece que o avanço ou processo das idéias não é linear, mas dialético, ou seja, se modificam e se transformam, porque todo investigador pertence a seu tempo e está limitado ao paradigma de sua época,  apesar de conter elementos antecipadores e revolucionários em seu pensamento.

É papel de uma revolução científica superar paradigmas, mas isso não quer dizer que o paradigma que foi superado fique totalmente esquecido. Na verdade, ele pode ser retomado por outro pensador em uma teoria nova. Podemos encontrar a seguinte situação: uma teoria A supera o paradigma de uma teoria B; mais tarde uma teoria C retoma aspectos da teoria B e supera a teoria A.

É desta maneira dialética, sob o ponto de vista histórico, que Gastón Bachelard (1884-1962), matemático e filósofo da ciência, compreendeu a história do conhecimento científico. Este avança em sucessivas retificações provocadas por um pensamento empenhado nas disputas das teorias.  A verdade de uma teoria é a retificação histórica de erros anteriores (REALE, 1990, p. 1014)

O termo dialética, do grego dialectica, significou inicialmente a arte do diálogo e da discussão. Depois de Hegel, assumiu o sentido de encadeamento de pensamentos nos quais o intelecto se arrasta sem poder se deter antes da última etapa (LALANDE, 1993, p. 256). Situação em que duas razões travam um confronto no qual se verifica uma espécie de acordo após sucessivas mudanças de posições induzidas pela posição contrária. Compreendendo melhor este conceito podemos resignificar a famosa frase de Newton: “Se enxerguei mais longe, foi porque me apoiei sobre os ombros de gigantes”.

A ciência moderna: o séc. XVIII
Estudamos que o advento da ciência moderna desencadeou alguns problemas dentre eles a questão do conhecimento verdadeiro. Vimos que duas correntes do pensamento trataram a questão e apresentaram teses opostas à apreensão do conhecimento. A primeira corrente, o racionalismo, no pensamento de Descartes - seu maior sistematizador. A segunda, o empirismo de John Locke com a tese da tábula rasa.
Durante o século XVIII, os pensadores intensificaram ainda mais seus estudos no sentido de construir teorias adequadas a essa nova forma de compreender o mundo, resultando em uma postura radical contra tudo que não apresentasse evidências experimentais.

O poder da nova sociedade estava intimamente ligado à ciência moderna. E, é nesse contexto, que surge o movimento do Iluminismo com três teses inovadoras, a saber: a liberdade, o individualismo e a igualdade. Teses que resultaram no movimento da Revolução Francesa (1789). Esse momento histórico configurou um movimento amplo que envolveu intensamente a filosofia, as artes, a literatura, a ciência e as doutrinas políticas e jurídicas da época. Como representantes dessa corrente de pensamento podemos citar Jean-Jacques Rousseau(1712-1778), Voltaire (1694-1778), Diderot (1713-1784), Immanuel Kant (1724-1804), David Hume (1711-1776), Beccaria (1738-1794) e tantos outros.
Foi um movimento cultural que utilizou os termos iluminismo, ilustração ou esclarecimento para indicar a metáfora da luz da razão em oposição às trevas, à ignorância e superstição. A sua idéia inicial estava calcada na concepção da autonomia do pensar e da capacidade de conhecer o real, ressaltando a idéia segundo a qual todos os homens são dotados de razão, uma luz natural que possibilita o desenvolvimento da filosofia, da ciência e da educação como projeto racional de progresso da humanidade.

O pensamento iluminista foi influenciado pelo movimento científico do séc. XVII, em particular pela revolução científica operada por Galileu Galilei. A descoberta do método experimental que valorizou a técnica contribuiu para o advento da várias ciências e a consequente dessacralização da Natureza. Para enriquecer o seu olhar, leia o texto “A ciência na corte”:
O vendaval de novas idéias trazidas pelo Iluminismo produziu, além de reformas políticas, um grande incentivo à investigação no campo das ciências naturais. As novas gerações de monarcas que surgiram ao longo do século XVIII, já formados no contexto do pensamento das Luzes, tinham grande interesse pelos temas ligados à filosofia natural, matemática, astronomia e história natural. Com isso, procuraram incentivar as investigações nesses campos. Tal movimento, conhecido como despotismo esclarecido, possibilitou um grande desenvolvimento da ciência moderna, que exigia cada vez mais instrumentos e artefatos sofisticados e caros.
Como consequência desse movimento começaram a surgir academias de ciências em vários países. Os reis e rainhas passaram a convidar filósofos naturais, naturalistas, astrônomos e matemáticos de renome para trabalhar nessas instituições, pagando-os pelo trabalho. Dessa forma, ao financiarem as investigações, viam seu mecenato eternizado nas dedicatórias que os filósofos colocavam em suas publicações, tradição já em vigor na Itália desde o Renascimento.
Uma das práticas bastante comuns entre os naturalistas da época era formar coleções de insetos, plantas e pedras. Alguns monarcas também procuravam patrocinar tais coleções, chegando a organizar expedições a diferentes regiões do globo com a finalidade de enriquecê-las.  Dessa forma, nasceu na França o Jardim do Rei, uma coletânea de espécimes provenientes de diversas regiões da Terra. Esse jardim transformou-se ao longo do século num dos mais importantes centros de pesquisa botânica do mundo.
A veneração pela filosofia e a história natural não se restringiu ao patrocínio das investigações dos cientistas. A ciência passou a frequentar também os salões da nobreza. Diversos aparatos experimentais que produziam efeitos curiosos foram levados a estes salões para animar festas e reuniões. Máquinas elétricas faziam sucesso nos encontros, produzindo faísca ou eletrizando corpos que se atraíam e repeliam. A ciência passou a frequentar as cortes da Europa, e muitos homens de ciência souberam tirar proveito disso. Sua importância se equiparou à da música e da literatura entre as classes abastadas da sociedade. [BRAGA, Marco. Breve história da ciência moderna. Das luzes ao sonho do doutor Frankenstein. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.  p. 23-24.]

Concluindo...

Acabamos de estudar alguns aspectos da ciência antiga e moderna. Assim, podemos destacar um conceito que nos parece interessante: o conceito de paradigma. Quando mencionamos que o movimento científico grego apresenta uma nova postura diante real, mas ainda está vinculado ao modelo do saber teórico ou contemplativo, estamos querendo dizer que os cientistas da Antiguidade não promoveram uma ruptura ou revolução no modelo grego.

Paradigma, do termo grego paradeigma, significa modelo ou padrão a ser seguido.  O físico Thomas Kuhn (1922-1996) na década de 60 definiu paradigma como aquilo que os membros de uma comunidade partilham (KUHN, 1978, p. 219). O paradigma ou modelo é a matriz ou o pressuposto a partir do qual se pode desenvolver um estudo científico. Uma referência inicial para o trabalho do cientista, ou seja, um conjunto de regras, leis, teorias que interferem na vida de todos nós, em especial em nosso pensamento.

Em alguns casos percebemos que novas teorias científicas promoveram rupturas com os modelos vigentes em sua época e, neste caso, costumamos dizer que houve uma substituição ou superação de paradigmas - uma modificação substancial em nossas referências. Vejamos alguns exemplos: o modelo heliocêntrico; a teoria de Darwin; a teoria de Einstein.

Podemos observar que em determinados momentos pensadores superam sua própria época construindo novas teorias. Na verdade, o ser humano pode modificar seus valores, modificar hábitos.

As rupturas epistemológicas

Gaston Bachelard (1884-1962) nos ensina que a ciência experimenta rupturas epistemológicas, ou seja, o aparecimento de novas teses, métodos, conceitos que negam e substituem idéias anteriores (BACHELARD, 1996, p. 18).

Para este filósofo da ciência, a história da ciência é a história de sucessivas rupturas epistemológicas. A palavra epistemologia, do grego episteme (ciência, conhecimento) e logos (discurso, ordem) é usada para designar a teoria do conhecimento científico (MORA, 1993, p. 216). Um conhecimento que apresenta uma trajetória que precisa ser investigada.

Mas o maior desafio, ou melhor, o maior obstáculo epistemológico está, por exemplo, na opinião (doxa), nos hábitos intelectuais cristalizados, em teorias científicas apresentadas como dogmas, dentre outros. Isto significa dizer que o maior obstáculo epistemológico pode ser desvelado no próprio sujeito do conhecimento que precisa aprender a retificar, diversificar e a precisar o conhecimento, mas para melhor questionar. O fato é que o conhecimento científico não tem fim e acrescenta: “todo conhecimento é resposta a uma pergunta. Se não há pergunta, não pode haver conhecimento científico” (BACHELARD, 1996, p. 18).

Na verdade, o cientista não elabora pergunta alguma se nada sabe acerca da resposta. Se não a soubesse, nada teria a perguntar. Todo cientista ao fazer ciência oferece um ponto de vista, uma interpretação. É nesse sentido que afirmamos que o pensamento não esgota o pensado, pois a realidade é mais rica do que a análise do cientista; a ciência é produto social; e, por fim, a ciência não gera certezas cabais (DEMO, 2007, p. 78-79).

Assim, estudamos que o conhecimento científico resulta da relação dialética entre nosso saber e nosso desconhecimento.

Aprendemos também que a ciência preserva o seu caráter hipotético, porque não há certezas absolutas.

O termo hipótese cuja origem decorre de hypó, “debaixo de”, “sob”, e thésis, “proposição” é a explicação provisória de algo observado. Pode ser entendida como uma interpretação inicial e que deve ser posteriormente confirmada.

Ao estudarmos a importância das hipóteses, compreendemos que o trabalho do cientista é movido por interesses, o que implica dizer que não há a análise pura e desinteressada dos fatos. Toda teoria que inicialmente nos parece oferecer alguma resposta a um problema, suscita novas indagações.

No âmbito do conhecimento científico, encontramos os conceitos de hipótese, teoria e fatos intimamente relacionados. Assim, podemos afirmar que o desenvolvimento do saber científico acontece no horizonte da relação entre fatos e teorias que possibilitam a formulação de novas hipóteses.

Referências:
ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2003.

BACHELARD, Gaston. A formação do espírito científico: contribuição para uma psicanálise do conhecimento científico. Rio de Janeiro: Contraponto, 1996.

DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais. São Paulo: Atlas, 2007.

KUHN, Thomas. Estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 1978.

LALANDE, André. Vocabulário técnico e crítico da filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1993.

LAKATOS, Eva M; MARCONI, Marina de A. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2000.

LLOYD, Geoffrey Ernest R. Early Greek Science: Thales to Aristotle. New York: Norton & Co., 1970.

MANCHESTER, William. Fogo sobre a Terra. A mentalidade medieval e o Renascimento. Rio de Janeiro: Ediouro, 2004.

MARCONDES, Danilo. Iniciação à história da filosofia. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.

MORA, José Ferrater. Dicionário de filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 1993, p. 216.

POPPER, Karl. Lógica da pesquisa científica. São Paulo: EDUSP, 1985.

_______. Autobiografia. São Paulo: Cultrix, 1977.

REALE, Giovanni. História da filosofia. São Paulo: Paulus, 1990. V. 1.


[1]  “O grande tratado” - um estudo sobre astronomia que apresenta as mais importantes teses da Antiguidade Clássica. Este cientista grego da fase alexandrina absorveu o conhecimento astronómico babilónico e grego. Nesta obra,  há a tese geocêntrica estudada pelos gregos antigos (REALE, 1990).

[2] O termo ganhou notoriedade com a obra de Jacob Burckhardt, sob o título A cultura do renascimento na Itália, publicada em 1860, referência importante no séc. XIX.
[3]  “Formular um problema consiste em dizer, de maneira explícita, clara , compreensível e operacional, qual a dificuldade com a qual nos defrontamos e que pretendemos resolver, limitando o seu campo e apresentando suas características. Desta forma, o objetivo da formulação do problema da pesquisa é torná-lo individualizado, específico, inconfundível”  - Rudio, F. V. Introdução ao projeto de pesquisa científica. Apud Lakatos, E. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 2000, p. 139.

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