Clara Maria C. Brum de Oliveira
Você saberia dizer o
que é pesquisa acadêmica? Qual a sua
contribuição para a formação docente?
Como surgem as
pesquisas? Qual a relação entre
pesquisa e pensamento reflexivo?
Como surgem as
pesquisas?
As pesquisas começam com
ideias, ou seja, experiências individuais, teorias, observações de fatos,
leitura de artigos etc. Podemos encontrar notícias, estudos, indagações,
debates sobre variados assuntos que direcionam nosso interesse para pesquisa. Podemos
afirmar que a possibilidade de êxito na atividade docente decorre em grande parte da sua relação com a
pesquisa acadêmica.
O que é necessário?
Quais as qualidades
pessoais do pesquisador?
Uma pessoa com o
perfil de pesquisador apresenta, em linhas gerais, algumas características,
dentre as quais destacamos: conhecimento do assunto a ser pesquisado;
curiosidade; criatividade; integridade intelectual; atitude autocorretiva;
sensibilidade social; imaginação disciplinada; perseverança e paciência (GIL,
2010). Posturas e atributos
imprescindíveis para a docência superior, pois pressupõe o conhecimento dos
conteúdos mais importantes, a atualização nas polêmicas teóricas, a precisão no
uso dos conceitos e a criatividade na interpretação.
É
muito importante observar que o pesquisador não é um gênio que, segundo o senso
comum nasceu pronto, mas alguém, cuja vivência acadêmica propiciou o
desenvolvimento de habilidades e
competências voltadas para a pesquisa científica (GIL, 2010).
É preciso advertir que
o processo da pesquisa não está
reservado a poucos, mas integra o caminho de todo o estudante universitário.
Para tanto, é importante conhecer a trajetória acadêmica, ter o domínio das
técnicas, o manejo dos dados e o conhecimento das regras de formatação – as
regras do jogo!
Nesse sentido, assista
à entrevista do pesquisador Miguel Nicolelis
Como afirma Pedro Demo
(2009), quem não pesquisa apenas reproduz ou apenas escuta. Ou aproveitando uma
ideia do senso comum, diz-nos o autor, o que os olhos não vêem [ leia-se lêem], o coração não sente!
Desmistificando
o conceito de Pesquisa!
Começando pelo
conceito de pesquisa...
A pesquisa é um
procedimento reflexivo, sistemático, controlado e crítico
que permite descobrir novos fatos ou dados, soluções ou leis, em qualquer área
do conhecimento.
Dessa forma, a
pesquisa é uma atividade voltada para a solução de problemas por meio
dos processos do método científico. Podemos, assim, indicar os três
elementos que caracterizam a pesquisa: a) o levantamento de algum
problema; b) a solução à qual se chega; c) os meios escolhidos
para chegar a essa solução, a saber, os instrumentos científicos e os
procedimentos adequados (RAMPAZZO, 2005, p.49). Vejamos alguns conceitos para o
termo:
(...) atividade
intelectual intencional que visa a responder às necessidades humanas. (...)
Pesquisar é o exercício intencional da pura atividade intelectual, visando a
melhorar as condições práticas de existência (SANTOS, 2007, 17-20)
A pesquisa pode ser considerada um procedimento
formal com método de pensamento reflexivo que requer um tratamento científico e
se constitui no caminho para se conhecer a realidade ou para descobrir verdades
parciais. Significa muito mais do que apenas procurar a verdade: é encontrar
respostas para questões propostas, utilizando métodos científicos (LAKATOS, 1992, p. 43.).
A pesquisa é um procedimento reflexivo,
sistemático, controlado e crítico que permite descobrir novos fatos ou dados,
soluções ou leis, em qualquer área do conhecimento. Dessa forma, a pesquisa é
uma atividade voltada para a solução de problemas por meio dos processos do
método científico. Podemos, assim, indicar os três elementos que caracterizam a
pesquisa: a) o levantamento de algum problema; b) a solução à qual se chega; c)
os meios escolhidos para chegar a essa solução, a saber, os instrumentos
científicos e os procedimentos adequados (RAMPAZZO, 2005, p.49).
Uma definição
pertinente de pesquisa poderia ser: diálogo inteligente com a realidade,
tornando-se como processo e atitude, e como integrante do cotidiano. (...)
Diálogo é fala contrária, entre
atores que se encontram e se defrontam (DEMO, 2009, p.37).
Pesquisar é pensar,
refletir, ler, discutir, perguntar, criticar, descobrir, enfim, é buscar uma
visão, uma explicação, uma idéia, uma solução para as perguntas e problemas que
nos movimentam e interessam; é construir, formar e organizar um pensamento
(próprio ou não); é alcançar um resultado que apazigúe ou que confirme a
inquietude inicial. Saber pesquisar é uma maneira para enfrentar qualquer
desafio novo, e a vida dos profissionais é uma constante renovação destes
desafios (MARQUES, 2003).
Por
que pesquisar? “Quem ensina carece pesquisar; quem pesquisa carece ensinar”
Lewis Hyde (1945 -)*
em recente entrevista mencionou que Johan Wolfgang Von Goethe(1749-1832) uma
vez respondeu à pergunta “Quem sou eu?” com a seguinte observação: “Guardei e
usei tudo que vi, ouvi e observei. Minhas obras foram nutridas por incontáveis
indivíduos, inocentes e sábios, brilhantes e estúpidos. Infância, maturidade e
velhice me trouxeram seus pensamentos, suas perspectivas de vida.
Frequentemente colhi o que outros
plantaram. Meu trabalho é obra de um ser coletivo que carrega o nome de
Goethe”.
*[Lewis
Hyde, nascido em 1945 é um erudito, ensaísta, tradutor, crítico cultural,
acadêmico e escritor . cf. FREITAS, Guilherme. Lewis Hyde: entre as ideias e o mercado. Disponível
em:<http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2011/03/05/lewis-hyde-entre-as-ideias-o-mercado-367212.asp>.
Acesso em: 21 abr 2011.]
Nesse mesmo sentido
podemos interpretar a celebérrima frase de Newton em que observa que somente pode chegar à formulação da
lei da gravidade porque se apoiou em ombros de gigantes, ou seja, pesquisou
quem veio antes. Nessas palavras aparentemente singelas, mas profundas numa
reflexão filosófica, podemos compreender as razões que conduzem um profissional de qualquer área do
conhecimento à pesquisar.
A pesquisa assume especial
destaque quando se trata da preparação do professor do Ensino Superior.
Portanto, não há como deixar de considerar o sentido de uma formação que
valorize a pesquisa, desmistificando o seu conceito a partir das ideias de
criar e emancipar. Nos dizeres de Pedro Demo (2009, p. 14) a atividade docente
e a pesquisa são elementos indissociáveis, porque para ser professor é preciso
construir um caminho através da pesquisa capaz de viabilizar as condições de
possibilidade do amadurecimento intelectual e acadêmico: “Quem ensina carece
pesquisar; quem pesquisa carece ensinar”.
Veja agora uma dica de Mário
Sergio Cortella: Ser um bom professor...
A pesquisa e o pensamento reflexivo...
Através da pesquisa
criam-se as condições para o pensamento
reflexivo, ou seja, aquele pensamento que se volta sobre si mesmo, exige
“posturas, atitudes e atributos mentais que nos permitem exercer a
flexibilidade e a curiosidade constante em relação a fatos e conceitos novos” (
ALVES, 2009, p. 55).
O
termo reflexão denota, nos dizeres de
Lalande (1993, p. 935), o retorno do pensamento sobre si mesmo. No uso corrente
do termo designa a ideia de suspensão crítica do juízo, seja para analisar e
compreender as causas ou razões de um fato; seja para calcular os efeitos de
determinadas formas de agir. Abbagnano (1982, p. 805) o define como o “ato ou o
processo por meio do qual o homem considera suas próprias operações” e mais
adiante acrescenta três definições, a saber: reflexão como o conhecimento que o
intelecto tem de si mesmo; reflexão como consciência; reflexão como abstração.
Immanuel
Kant (1724-1804) construiu o conceito de reflexão
transcendental em que o sujeito pensante examina e compara a ligação de
várias representações: “A reflexão é a consciência da relação de certas
representações dadas com as nossas diferentes fontes de conhecimento” (apud
LALANDE, 1993, p. 935). Por isso uma análise reflexiva nos leva a perceber as
próprias condições do pensamento, seja ele qual for.
A
pesquisa, portanto como atividade reflexiva contribui para o desenvolvimento do
conhecimento humano em todas as áreas, sendo sistematicamente planejada e
executada segundo critérios rigorosos de processamento das informações. Será
chamada de científica se for objeto de uma investigação planejada,
desenvolvida e redigida conforme normas metodológicas consagradas pela
ciência.
Segundo Pedro Demo
(2009) pesquisar coincide com criação e emancipação. Através da pesquisa se estabelece um verdadeiro diálogo com
a realidade nos permitindo construir uma consciência crítica, um espírito crítico.
Por isso, não se trata de copiar o que já foi dito, mas reconstruir oferecendo
novas possibilidades.
No âmbito universitário,
a pesquisa assume um lugar de destaque. É indiscutível que o ensino sempre foi
considerado uma atividade primordial da universidade, desde a Idade Média.
Todavia o princípio que relaciona ensino e pesquisa foi apresentado por Wilhelm
Von Humboldt, na ocasião que criou a Universidade de Berlim, em 1810,
introduzido no ensino brasileiro em 1968, para enriquecer a atividade
universitária (BOAVENTURA, 2009, p. 20). Nesse sentido, a nossa trajetória tem
mostrado que essa relação se tornou um instrumento útil de qualificação teórica
para os estudantes e professores. A pesquisa significa, antes de tudo, a
conquista de novos territórios (DRUCKER, 2008, p. 291).
Para iniciar uma
pesquisa é preciso conhecer as modalidades disponíveis. E, nesse sentido, uma
classificação com base em critérios poderá ser útil. Nesse processo alguns
cuidados são recomendáveis. Encontramos em farta literatura sobre o assunto uma
classificação do ponto de vista de sua
·
Natureza, ou seja, essência;
·
Abordagem, que significa
forma de tratar alguma questão;
·
Objetivos, entenda-se
finalidade ou motivo;
·
Procedimentos, que se traduz
no sentido de maneiras de agir ou instruções.
Antes de prosseguir,
assista ao vídeo Modalidades de Pesquisa
em Educação
Recomendamos que você
estude o significado de cada uma, considerando a pesquisa que terá de realizar.
Pesquisa e Ideologia
Pedro Demo (2007) observa que um pesquisador deve estar atento a um
elemento que não apresenta o critério de cientificidade, a ideologia, além do
senso comum. Isso significa dizer que não produzimos um saber desvinculado de
algumas concepções ideológicas, porque é impossível trabalhar o conhecimento
desvinculado de seu aspecto histórico, um conhecimento descontextualizado. E nesse aspecto, sabemos que certas
concepções justificam algumas posições sociais vantajosas (DEMO, 2007).
Trata-se de um tipo de pensar desvinculado da realidade.
E acrescenta que a ideologia “é intrinsecamente tendenciosa, no sentido
de não encarar a realidade assim como ela é, mas como gostaria que fosse”
(DEMO, 2007, p. 18). Mais adiante adverte que “a ideologia usa de instrumentos
científicos, no que pode adquirir extrema sofisticação. Pode chegar à mentira,
quando não só deturpa, mas inverte os fatos, fazendo de versões, fatos” (DEMO,
2007, p. 19).
Segundo Abbagnano (1982, p. 506) o significado moderno do termo ideologia
é empregado para indicar um tipo especial de análise destituída de validade
objetiva, todavia mantida pelos interesses claros ou velados daqueles que deles
se servem, o que se coaduna com a tese defendida por Pedro Demo.
Esta visão tornou-se importante a partir do pensamento de Karl Marx que a
compreendeu como o conjunto de crenças (doxa)
que não apresenta validade além dos interesses prevalecentes, apresentando uma
utilidade social para quem a produz ou acolhe.
É nesse sentido que Abbagnano (1982) afirma que ciência e ideologia
habitam esferas distintas. A primeira ocupa o espaço da observação e do
raciocínio; a segunda, a esfera do
sentimento e da fé. Assim, a função da ideologia é dirigir a ação, persuadir na
direção de certa visão de mundo.
Para ficar mais claro, vejamos um exemplo: durante a Idade média havia a
concepção do amor fraterno cristão, todavia inserida numa realidade social
marcadamente desigual e opressora. Então esse amor fraterno fica limitado à
esfera do irrealizável, do desejável, por isso é uma concepção ideológica.
O pesquisador deve ser cauteloso em sua pesquisa, pois a ideologia é
“compreendida como uma sombra inevitável dos fenômenos do poder, que dela lança
mão para se justificar” (DEMO, 2007, p. 19). É por isso que dissemos com Demo
(2207, p. 19) que a pesquisa está pervadida de ideologias, ou seja, o
conhecimento é influenciado pelo poder:
A ideologia mais inteligente é a que se traveste de ciência. Por isso,
seu arquiteto típico é o intelectual, figura importante na justificação do
poder, como também no outro dado: na elaboração da contra-ideologia, com vistas
a mudar a história dominante. Entre os intelectuais sobressaem os que têm
origem nas ciências sociais e similares, porque estão mais afeitos às condições
sociais da estruturação do poder e das vantagens. Neste contexto transparece já
a tendência histórica das ciências sociais de estarem mais a serviço do poder,
organizando técnicas de controle social, do que a serviço da emancipação dos
desiguais.
Nas ciências sociais, o fenômeno ideológico é intrínseco, pois está no
sujeito e no objeto. A própria realidade social é ideológica, porque é produto
histórico no contexto da unidade de contrários, em parte feita por atores
políticos, que não poderiam – mesmo que o quisessem – ser neutros. Não existe
história neutra como não existe ator social neutro. É possível controlar a
ideologia, mas não suprimi-la.
Dessa percepção, podemos
inferir que todo objeto de pesquisa é um objeto construído. Assim, não podemos
deixar de ouvir as recomendações de Habermas, ao expressar a visão da crítica
frankfurtiana, segundo a qual não podemos confundir o pensar com a realidade
pensada (apud DEMO, 2007). “A
ciência trabalha com uma realidade construída” (DEMO, 2007, p. 28). Ou como afirma Gaston Bachelard (1996,
p. 18): “Para o espírito científico, todo conhecimento é resposta a uma
pergunta. Se não há pergunta, não pode haver conhecimento científico. Nada é
evidente. Nada é gratuito. Tudo é construído”.
É com esse olhar que o docente deve reavaliar cuidadosa e constantemente
a sua própria prática, refletindo sobre ela, para modificá-la como um professor
reflexivo. E esse movimento surge a partir da pesquisa.
Referências:
ALVES, H. C. O
professor reflexivo, sua formacão e sua práxis pedagógica. In: I congresso
internacional de Educação e Comunicacão. Anais.
Foz do Iguaçu/PR: UDC, nov. 2009. P. 52-61. Disponível em: <http://www.udc.edu.br/CongressoEduCom.pdf>.
Acesso em: 24 abr 2011.
BACHELARD, G. A formação do espírito científico. Rio
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BOAVENTURA, E. M. Metodologia da pesquisa. São Paulo:
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DEMO, Pedro. Metodologia científica em ciências sociais.
3. ed. São Paulo: Atlas, 2007.
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educativo. 13. ed. São Paulo: Cortez, 2009.
DRÜCKER, Claudia. A base da distinção entre ensino e
pesquisa em filosofia. In: KUIAVA,
Evaldo A.; SANGALLI, Idalgo J.; CARBONARA, Vanderlei (Org.).
Filosofia, formação docente e cidadania.
Ijuí - RS: UNIJUÍ, 2008. p. 291-299.
MARQUES, Cláudia de
Lima. Pesquisa de Iniciação Científica: da inquietude ao sucesso! Palavra do orientador. Disponível
em: <http://www.ufrgs.br/propesq/informativo/ic04/orientador.htm>. Acesso
em: 14 mar. 2003.
RAMPAZZO, Lino. Metodologia
Científica: para alunos dos cursos de pós-graduação e pós-graduação. 3. ed.
São Paulo: Loyola, 2005.
SANTOS, A. R. Metodologia
Científica. A construção do
conhecimento. RJ: Lamparina, 2007.
SEVERINO, Antônio J. Metodologia
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Paulo: Cortez, 2007.
CASTRO, Cláudio de
Moura. A prática da pesquisa. 2 .ed. São Paulo: Pearson Prentice Hall,
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GIL, A. C. Como
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LAKATOS, Eva Maria. Metodologia
científica. São Paulo: Atlas, 2000.
Popper, K. Lógica
das Ciências Sociais. Rio de Janeiro/Brasília: Tempo
Brasileiro/Universidade de Brasília, 1978.
SANTOS , A. R. Metodologia
Científica. A construção do
conhecimento. RJ: Lamparina, 2007.
SEVERINO, Antônio J. Metodologia
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SAMPIERI, R. H.;
COLLADO, F. C.; LUCIO, P. B. Metodologia
da pesquisa. 3. Ed. São Paulo: Mc Graw-Hill, 2006.
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